terça-feira, 22 de setembro de 2009

cartoon from www.weblogcartoons.com
Cartoon by Dave Walker. Find more cartoons you can freely re-use on your blog at We Blog Cartoons.

Nascemos programados para crer?

O jornal inglês, Sunday Times, na sua edição eletrônica, publicou recentemente uma matéria com titulo "We are born to believe in God", em que apresentava pesquisas científicas sobre uma "predisposição fisiológica" das pessoas em acreditar em Deus e possuir sentimentos religiosos.


A esse respeito, o blog Soli Deo Glória (aqui) ressalta a parcialidade e reducionismo dessa linha de pesquisa, que procura diminuir o valor da fé a um ímpeto primitivo e incontrolável (como se isso, em si, já não fosse uma contradição).


Abaixo, reproduzo os comentários do amigo blogueiro:


O jornal Times de Londres apresentou no referido artigo a última 'pesquisa' que 'demonstra' que as pessoas não são capazes de controlar suas tendências irracionais e simplesmente têm que acreditar em Deus... O artigo faz declarações dúbias como: 'Este trabalho é suportado por outros que encontraram evidências de que os sentimentos e experiências religiosas estão ligados a áreas específicas do cérebro'. Eles sugerem que as pessoas são programadas para possuirem sentimentos de espiritualidade provenientes de nada mais que atividade elétrica nessas regiões.


Sendo assim, alguém poderia dizer:




"Pensamentos ateístas não são nada além de atividade elétrica em certa regiões 'racionais' do cérebro."


"A paixão de William Wilberforce para acabar com a escravidão não era nada mais que atividades elétricas em certas regiões "misericordiosas" do seu cérebro"


"O ódio dos terroristas nada são do que atividades elétricas em seus cérebros"


Contudo, estes "cientistas" não fazem tais assertivas. Que não consideremos essas coisas como ciência.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Unfinished tasks

Meu dia-a-dia tem parecido um pouco com isso:
cartoon from www.weblogcartoons.com
Cartoon by Dave Walker.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

O numinoso e a divindade de Cristo


Aparentemente, Deus criou o homem com a capacidade inata de reconhecer o Divino. Talvez, a herança que trazemos de antes da queda de Adão seja a possibilidade de reconhecer a Divindade como tal, em todos os seus atributos – onipotente, onisciente, onipresente, maravilhoso. No homem, o “slot” para encaixar o Divino, “vem de fábrica”. Esse atributo é a capacidade do homem de produzir o sagrado.

O sagrado é inerente ao fenômeno religioso, uma vez que a experiência religiosa consiste na relação da pessoa com o sagrado.  Na experiência religiosa, experimenta-se a presença de um poder estranho, totalmente diferente - totalmente outro. A atitude natural da pessoa, diante de tal presença, é de espanto e fé.

A experiência religiosa não consiste apenas de afirmações racionais e de princípios morais; há no sagrado um aspecto inefável, percebido pelo sentimento como realidade sagrada, como mistério terrível e fascinante: “eu tenho medo dele e ao mesmo tempo ardor por ele” (Santo Agostinho).

A psicologia da religião afirma que estes sentimentos não são produzidos pela consciência, mas são o efeito subjetivo da presença, no eu, de uma realidade diferente do próprio eu: o numinoso. Na compreensão de Jung, o numinoso é uma instância ou efeito que arrebata e controla o sujeito humano, o qual é antes vítima que criador. O numinoso é uma experiência do sujeito que se sobrepõe à vontade.

Jung afirma que a experiência com o numinoso não é ação da vontade humana, antes é uma atitude de abertura ao sentimento de força tremenda que, em si, encerra um significado ainda não revelado, atrativo e profético ou fatídico. Segundo as suas pesquisas acerca da religião, Jung afirma que conteúdos previamente inconscientes rompem as barreiras do ego e dominam a personalidade consciente da mesma maneira como em situações patológicas. O numinoso, então, se apresenta como um elemento da inconsciência coletiva. Algo que o ser humano carrega dentro de si. Para ele, a experiência religiosa não sustenta uma prova da existência de Deus; porém, em todos os casos, são experiências arrebatadoras que excedem a descrição em palavras.

O conceito de numinoso em Jung provêm do teólogo Rudolf Otto, que o caracteriza por ser Tremendum (que causa tremor), Majestas (avassalador), Mysterium (o totalmente oculto). O Numinoso é “fascinante” e “assombroso” a um só tempo. A essência do numinoso está na sua potência e alteridade. O Numinoso é ao mesmo tempo totalmente diferente do homem, e totalmente poderoso.

As experiências sagradas colocam o crente em contato com o numinoso. Todas as experiências com Deus são experiências com o Sagrado. Contudo, nem sempre a experiência com o sagrado – a experiência religiosa – é uma experiência com Deus.

A secura dos corações no nosso tempo tem levado as pessoas a buscar um encontro com o Numinoso. No desejo de se voltarem para Deus, muitas vezes se perdem por caminhos sagrados que não levam ao Divino. Muitos são os que desejam antes “sentir” a presença de Deus do que “conhecê-lo”. Por isso tantas igrejas lotadas e tão pouca mudança de vida.

Como pode um país ter tal contingente de cristãos e não apresentar significativas mudanças nos seus indicadores sociais, de violência, de exclusão? Muitos são os templos, para as quais afluem multidões a propósito de um encontro com o Divino, produzindo, em vez disso, experiências com o sagrado que não atravessam as paredes do templo. São noites em que as pessoas se voltam para dentro de si, olhando para o arquétipo que carregam em seu inconsciente. Olham para o leito seco do rio, imaginando contemplar um turbilhão de águas.

As experiências com o sagrado – exclusivamente – não provocam desdobramentos para a vida. Estão restritas e localizadas a um lugar e momento. A maravilha, o temor e o fascínio provocado pelo sagrado bem podem ser experimentados em um grande concerto de rock – ou sob o efeito de anfetaminas – mas isso não transborda em vida, e vida em abundância.

Ainda que a presença de Deus nos arrebate para uma experiência além do compreensível, o Divino não se manifesta somente em temor e tremor. Já estão gastos os cacoetes evangélicos, os quais reúnem um leque de gemidos, tremores, pulos e levantar de mãos, mas que não se materializam no amor ao próximo, no comportamento ético e no compromisso com Deus. O Divino se manifesta no amor em ação – como o amor do Bom Samaritano – mesmo que não se apresente como experiência religiosa.

O rito sagrado pode nos levar ao numinoso, mas a revelação do Divino é ação da parte de Deus. Ele se releva quando quer. Para tanto, o rito não é o que importa, mas a disposição existencial de se jogar no desconhecido, abrir os braços para a revelação de Deus. Somente Cristo transforma nosso ser – a moral, o comportamento, o amor ao próximo. A experiência com o Divino provoca em nós uma mudança de consciência, compromisso com a vida; uma ação transformadora do mundo da vida.

A vida ascética para a qual o sagrado nos dirige, em que a negação da vida na terra nos aproxime do numinoso, são relações verticais entre o ser e o “transcendente” universal – apenas nos leva para dentro de nós mesmos. Este ascetismo nos afasta das pessoas. O Divino, contudo, nos leva ao outro:  “Amai-vos uns aos outros como eu os amei”,“Ide a anunciai”.

Na distinção entre o Sagrado e o Divino, entre os mitos, arquétipos e divindades numinosas e o Cristo, a abundância de vida é o que se apresenta. A vida de Jesus é o que o separa de um mito qualquer.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

A Boa Nova é uma sentença de morte

  "Em verdade, em verdade vos digo: se o grão de trigo, 
caindo na terra, não morrer, fica ele só; 
mas, se morrer, produz muito fruto." (João 12:24)


Como podemos viver nesse mundo moderno, cheio de pressões, metas, obrigações, estratégias? O Sábio de Eclesiastes, que de tudo fez e conheceu, no final afirmou: "é tudo como correr atrás do vento".  Isso significa que não vale a pena existir? Devemos então desistir de ter um trabalho, conhecimentos, titulações, certificados, experiências? Se tudo não passa de correr atrás do vento, se afinal estamos apenas ajuntando tesouros na terra, os quais a traça come... que valor há em existir? Será que Deus nos chama a todos para sermos como João Batista, como nazireus ?


Jesus disse à multidão no sermão do monte: "Entrai pela porta estreita. Larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz para a perdição, e são muitos os que entram por ela. Porque estreita é a porta, e apertado, o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que acertam com ela.” Ou seja, temos um estreito caminho para percorrer, espremido, espinhoso e difícil, e no final ainda há uma porta estreitinha para atravessarmos.


Freud, em seu livro “Mal-Estar da Civilização”, analisa o porquê de vivermos angustiados e espremidos entre os nossos desejos e as regras da moral. Ele aponta que o homem é essencialmente egoísta e a-moral. Isso quer dizer que, movido pelo “princípio do prazer”, o ser humano, em seu estado “natural”, não mede esforços para realizar os seus desejos, quaisquer que sejam eles. Freud, em certa ocasião, diz que "as crianças são completamente egoístas; elas desejam intensamente e lutam sem cessar para satisfazer esses desejos". Essa é a natureza (caída) humana.


Sobre isso, o apóstolo Paulo disse aos Romanos: "Portanto, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens por isso que todos pecaram; Como está escrito: Não há um justo, nem um sequer. Não há ninguém que entenda; Não há ninguém que busque a Deus."


Até mesmo aos olhos dos homens – pressupondo que de Freud não provém revelação divina – é possível compreender que o ser humano é mau; não há um justo sequer; até as crianças são rápidas em buscar seus próprios e egoístas desejos. É natural ao homem enganar, matar, roubar.


A civilização surge, então, de acordo com Freud, como um grande acordo no sentido de reduzir o risco. O princípio do prazer leva as pessoas a buscarem os seus desejos; na impossibilidade de conseguirem o que querem, buscam o menor des-prazer. Os seres humanos, coletivamente, perceberam que, ao criar regras e abrir mão de desejos individuais – tais como dormir com a mulher do vizinho ou possuir alguma propriedade alheia – se protegeriam de um des-prazer maior – tal como ter sua mulher ou seu carro roubados por alguém.
Mas, apesar de termos mudado o modo como vivemos, nós somos os mesmos. Por dentro ainda temos os mesmos instintos maus. A luta por refrearmos os nossos desejos em troca de uma moral construída de fora pra dentro é a fonte da angústia da civilização. "A sociedade civilizada é perpetuamente ameaçada pela desintegração, através da hostilidade primária dos homens, uns contra os outros", diz Freud.


Nesta ótica, não é possível enxergar saída. Por nós mesmos, somente produziremos angústia. Assim caminha a sociedade: repressão de instintos que gera angústia e insatisfação, terminando por explodir em loucura. Pelos frutos, conhecereis a árvore...  Como poderemos dar bons frutos se somos nascidos e formados de espinheiro? Se nosso DNA é de abrolhos, como podemos dar figos?


Certamente, Freud não poderia compreender o novo homem.  Ele só conhecia a natureza caída do velho homem. Negar-se a si mesmo não faz parte do repertório da pessoa freudiana. Não há salvação para esse velho homem, é preciso enterrar a velha criatura e nascer de novo, com nova natureza, novos instintos, nova vida.


A mudança de caminho só é possível se encontrarmos a cura para a natureza humana; uma cura de dentro pra fora. Sem o sacrifício de Jesus, nada podemos fazer. "Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer"(Jo 15:5-6).


 Para nosso consolo, Paulo diz que nossa esperança está na fé justificadora, em Jesus: "... a justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo (é) para todos e sobre todos os que crêem; porque não há diferença. Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus; Sendo justificados gratuitamente pela sua graça, pela redenção que há em Cristo Jesus. Ao qual Deus propôs para propiciação pela fé no seu sangue, para demonstrar a sua justiça pela remissão dos pecados dantes cometidos, sob a paciência de Deus; Para demonstração da sua justiça neste tempo presente, para que ele seja justo e justificador daquele que tem fé em Jesus"(Romanos, 3:22-26).


O sacrifício oferecido diariamente pelos sacerdotes do antigo testamento não tinham efeito duradouro para remissão de pecados. A cada dia, um novo sacrifício era preciso. Contudo, o sacrifício de Jesus foi definitivo, “com uma só oblação aperfeiçoou para sempre os que são santificados.” Jesus, no seu sacrifício perfeito nos aperfeiçoou o espírito. Podemos mudar de trilha, seguir um caminho que não nos guie à angústia.


É isso que fazemos? Nem sempre. A mente ainda encontra-se presa à carne. O espírito está pronto, mas a carne é fraca. Pela fé em Jesus somos redimidos de nossos pecados, e Deus não mais se lembrará deles. Nossa velha criatura está para sempre enterrada, e somos nascidos de novo. Mas a santificação provém do hábito. Precisamos diuturnamente crucificar nossa carne e subjugar a mente à obediência de Cristo. É fé exercida com esforço, disciplina. Fé de atleta. Fé militar. Fé espartana.


Se apenas houvesse a porta estreita, bastava que nos espremêssemos momentaneamente. Mas não é uma porta, é um caminho. Quão longo é esse caminho? Deve ser tão longo quanto for a nossa vida nessa Terra... Um longo caminho estreito – que parecerá bem menos longo quando, finalmente, tivermos cruzado a porta. Ufa!... Até lá, contudo...


Este é o desafio da fé em Jesus: ela precisa ser vivida, respirada, exercida diariamente, passo a passo. Precisamos escolher a cada passo prosseguir no (cada vez mais) estreito caminho. Tal escolha é artificial, psicótica, contrária à natureza humana, contrária ao desejo e ao princípio do prazer. É loucura. Por isso é preciso morrer, porque não é possível conservar a natureza humana e, ao mesmo tempo, permanecer na videira.


A mensagem de Cristo é mensagem de vida, eterna e em abundância, mas diariamente sentencia de morte o velho homem, a velha criatura, as coisas passadas. É boa nova acerca da morte para a lei, por meio do corpo de Cristo, para pertencermos a outro corpo, a saber, aquele que ressuscitou dentre os mortos.


 “Agora, porém, libertados da lei, estamos mortos para aquilo a que estávamos sujeitos, de modo que servimos em novidade de espírito e não na caducidade da letra." (Romanos 4:5-7)

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Saber perguntar é poder conhecer

“E, passando Jesus, viu um homem cego de nascença. E os seus discípulos lhe perguntaram, dizendo: Rabi, quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego? Jesus respondeu: Nem ele pecou nem seus pais; mas foi assim para que se manifestem nele as obras de Deus” 
João 9:1,2





Em um determinado momento da minha vida, me vi diante de um beco sem saída, defrontado com uma questão que – naquela ocasião – me parecia a questão-chave da minha vida. Por diversos dias orei, buscando saber de Deus que rumo tomar. Por que aquilo estava acontecendo? Como deveria me comportar? Qual a razão de tudo isso?

Por um bom tempo, não obtive resposta de Deus. Percebi, então, que as minhas perguntas já pressupunham uma expectativa de respostas. Se você fez vestibular, deve conhecer um tipo de questão cuja resposta é um número entre zero e 99. Se você quiser responder “pato”, não encontrará maneira de expressar essa resposta. Foi o que me aconteceu. O que Deus tinha a me dizer não se enquadrava no tipo de resposta que eu estava esperando.

Quando desisti de receber minha resposta – da maneira e na forma como eu desejava – e procurei a Deus livremente, Ele falou comigo. A resposta de Deus foi: “Essa pergunta é irrelevante. Você não está fazendo a pergunta certa.”

Aprendi, então, que saber perguntar a Deus é o caminho para obter respostas mais diretas.

Quando os discípulos de Jesus se depararam com o homem cego, buscaram nos seus conhecimentos um padrão de fatos e evidências que pudesse justificar aquele evento. Na cultura judaica, acreditava-se que defeitos físicos de nascença eram conseqüência de pecados. Ao questionarem Jesus, os discípulos determinaram o tipo de resposta que esperavam ouvir – era uma pergunta de “marcar x”: ou o homem pecou, ou os pais pecaram.

A resposta de Jesus foi para eles, no mínimo, constrangedora. Jesus disse algo como: “nem um, nem outro”; ou “NDA - nenhuma das alternativas anteriores”.

A linha de raciocínio dos discípulos não estava errada em si. Uma vez que seus conhecimentos e suas tradições lhes diziam que aquele problema somente poderia ser decorrente de algum pecado ou falha contra Deus, certamente esta falha só poderia ser do cego ou da família. Os discípulos estavam olhando para a causa do problema – quem era o culpado por isso. Jesus aponta para o que Deus poderia fazer naquela situação – manifestar sua glória na vida daquele jovem. Muitas vezes, estamos como os seguidores de Jesus, olhando para o lado errado, sem entender o plano de Deus naquilo que estamos vendo.

Jesus freqüentemente está interessado em quebrar nossos paradigmas e nos libertar dos nossos conhecimentos prévios. Ele quer nos dar uma nova mente, com a qual possamos enxergar o mundo sob a Sua ótica. Assim Ele fez com os discípulos durante os dias que passou com eles. Muitas foram as ocasiões em que Jesus os repreendeu, exortou e corrigiu – não poucas vezes de maneira um tanto embaraçosa, em vista da radical diferença no modo de ver as coisas.

O agir do Espírito em nós nos proporciona uma nova mente, uma nova visão de mundo. Somos estrangeiros em terra estranha, a cultura desse mundo não é a cultura do Reino. Por isso, Deus nos apresenta a Sua maneira de enxergar as coisas.

O exemplo dos discípulos nos ajuda a melhor nos posicionarmos diante de Deus. Devemos fazer perguntas, para que possamos conhecer e prosseguir em conhecer a Deus. Mas precisamos estar de olhos, ouvidos e corações atentos à resposta, ainda que ela seja diferente do que esperamos. Nem sempre a resposta de Deus se encaixara no nosso “zero a 99”.

O Senhor nos dá a liberdade de perguntar tudo o que desejarmos saber, mesmo coisas complicadas e difíceis. Ele não é inseguro ou melindroso. Deus não teme nossos questionamentos. “Provai e vede que o Senhor é bom”. Ele nos desafia a “prová-lo”. Certamente não nos atingirá com raios enfurecidos se perguntarmos coisas tolas ou absurdas. Mesmo quando, irritados e indignados, nos voltamos para Deus com protestos e reclamações, ele nos aconselhará gentilmente, e nos guiará para um caminho mais reto.

O que o nosso Pai deseja é que tenhamos relacionamento com Ele. Da mesma forma como nós mesmos preferimos conversar com um filho confuso e irritado, do que não se relacionar com ele ou não saber o que se passa, assim é o Senhor. Ele quer relacionar-se conosco.

Deus deseja que sejamos filhos maduros, experimentados na palavra de justiça e com os sentidos exercitados (cf. Hebeus 3:14,15). Ele nos desafia a fazer questionamentos e a fortalecer a nossa fé. É preciso por em prática a capacidade de refletir, criticar, questionar e compreender - até onde for possível - tudo quanto nos rodeia. Nem mesmo Deus - inclusive sua revelação - deve estar além dos domínios da investigação, pois nada é possível conhecer de Deus se não for por Ele mesmo revelado a nós. É o Senhor que responde as perguntas a seu respeito.

Por tudo isso, é saudável e recomendado perguntar a Deus tudo o quanto se deseje conhecer. Mas não esperemos que as respostas sejam conforme as nossas expectativas. Que Deus possa quebrar nossos paradigmas, trocar nossas lentes e nos surpreender com uma nova visão de mundo.

A voz que arde no peito

Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, 
que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, 
santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. 
 E não sede conformados com este mundo, 
mas sede transformados pela renovação 
do vosso entendimento, para que experimenteis qual 
seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus.
Romanos 12:1,2

Jesus, no princípio do seu ministério, recrutou para si os seus apóstolos, homens enviados a cumprir a missão multiplicadora do evangelho do Reino. Por meio desses homens, o mundo veio a conhecer a mensagem de Jesus. O processo de seleção desses homens extrapola, em muito, a lógica humana – mais uma evidência da divindade do Rabi.
Se hoje fossemos escolher doze dentre todos os homens da terra, para divulgar uma mensagem fundamental, confrontando todo e qualquer obstáculo, certamente optaríamos por um perfil bem diferente do escolhido por Jesus. “E, andando junto do mar da Galiléia, viu Simão, e André, seu irmão, que lançavam a rede ao mar, pois eram pescadores. E Jesus lhes disse: Vinde após mim, e eu farei que sejais pescadores de homens. E, deixando logo as suas redes, o seguiram.” (Marcos 1:16-18)
Os homens que Jesus escolheu eram pescadores. Ele recrutou, para serem seus apóstolos, homens que nada conheciam além da rede e do mar. Os advogados da mensagem do Reino – essa nova doutrina, a qual seria alvo de inúmeros óbices por milhares de anos a fio – eram iletrados e rudes.
Contudo, o preço pago pelos amigos de Jesus foi enorme. Eles passaram em uma prova pela qual muitos de nós não passariam. Para aqueles homens, a praia era a sua vida – e esse foi o preço para seguirem a Jesus. A vida de pescadores cabe inteira entre o mar e a praia. Ano após ano, geração após geração, o pescador se alterna entre jogar a rede ao mar e arrastar a rede para a praia. De avô para pai, filho e neto, o pescador é fruto-do-mar. No mar ele vive e do mar que ele faz viver a sua família.
“E, passando dali um pouco mais adiante, viu Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, que estavam no barco consertando as redes, E logo os chamou. E eles, deixando o seu pai Zebedeu no barco com os jornaleiros, foram após ele.” (Marcos 1: 19-20)
A prova exigida por estes homens significava abandonar tudo o que eles conheciam a respeito da vida. Toda a tradição de uma família. Seguir a Jesus mudaria até mesmo os seus nomes – não mais “Tiago, pescador, filho de Zebedeu”. Deste dia em diante, deixavam para trás o ofício e o pai. Teriam novos nomes, nova família.
Os pescadores-apóstolos ouviram a voz do Pai, ardendo em seus peitos. Atentaram para a voz que não é possível calar. Ouviram o espírito ordenando: “Não diga: sou apenas um pescador. A todos a quem eu te enviar, irás; e tudo quanto te mandar, falarás” (Jeremias 1:7). Ao ouvir a vós do Espírito, toda uma vida inteira se torna pouco para se deixar para trás.
Hoje, os nossos mundos vão bem além do mar. O horizonte do homem moderno atravessa os mares e alcança o outro lado do globo. Nossas vidas são muito mais do que a água e a praia. Em nossos dias, já não importam os valores da tradição: podemos decidir que destino seguir. Já não temos compromisso com nossos pais: optamos pela vocação que nosso coração nos dita. Somos livres para escolher caminhos e ofícios.
Temos muito menos a perder que os Apóstolos de Jesus, mas não estamos fazendo mais do que eles pela vinda do Reino.
Alguns de nós sentem que a vida não é como Deus gostaria que fosse. Desejam viver em um planeta mais justo, menos violento, menos egoísta, mais humano. Mas os valores que ditam esse tempo não são humanos, altruístas, justos... os valores deste séculos são o reflexo do que ele é. Este tempo clama por ajuntar, produzir, realizar.
O barulho de nossos dias abafou a voz do Espírito. Não mais nos arde a Voz no peito. Deixamos que nossos corações e mentes se acostumassem com os valores dessa era. Fomos conformados – isto é, tomamos a forma desse tempo: trabalho demais, oração de menos, descuido do espírito, da alma e da família. Por que ficaram surdos ouvidos de nossas almas?
Portanto, como diz o Espírito Santo: Se ouvirdes hoje a sua voz, não endureçais os vossos corações, como na provocação, no dia da tentação no deserto. Onde vossos pais me tentaram, me provaram, e viram por quarenta anos as minhas obras. Por isso me indignei contra esta geração, E disse: Estes sempre erram em seu coração, E não conheceram os meus caminhos. (Hebreus 3:7-10)
A mensagem do Reino exige de nós uma ruptura com a vida. O que Deus requer de nós é a nossa vida por inteiro, não importando seus limites territoriais. Esteja ela restrita ao mar e à praia, ou estendida por cinco continentes, o preço é o mesmo: inteira.
Jesus deixou claro que o Reino não pode esperar. Nada é mais urgente do que a vinda do Messias, que chegará antes que estejamos prontos, assim com vem um ladrão. Ao ouvirem a voz do Espírito chamando, alguns talvez retruquem: - sou muito jovem. Outros: - sou muito velho. Ou: Sou muito ocupado; tenho muitos bens; muitas obrigações. A todos que ouvem a Voz de Jesus e se voltam ao mundo, ele mesmo já disse: Ninguém que lança a mão do arado e olha para trás é apto para o Reino de Deus (Lucas 9:62).
Oremos para que Deus nos dê ouvidos atentos para a sua voz. Que possamos ouvir a voz que diz: aonde te enviar, IRÁS.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Quando não há mais sentido, o sentido se releva em Deus

"Que grande inutilidade!", diz o mestre. 
"Que grande inutilidade! Nada faz sentido!" 
Eclesiastes 1:2




Carpe Diem, aproveite o dia! A palavra de ordem de nossos dias é viver intensamente. A lógica do McDonalds – super size, fast food – tomou conta do mundo da vida. A pessoas desejam que tudo seja imediato, e ao máximo possível. Assim é a trajetória do autor de Eclesiastes: de tudo ele experimentou em intensidade, do bem e do mal, do útil e do fútil. E o resultado foi: enfado.


O Sábio descreve que a existência humana não se converte em vida se não encontrarmos um significado para existir. Na sua observação e experiência, apesar de todos os empreendimentos e realizações, foi incapaz de encontrar esse significado, e tudo veio a ser monotonia e cansaço.


De fato, ele buscou arduamente este sentido. O livro de Eclesiastes bem poderia ser a biografia de um bon vivan, de um boêmio, presente em todas as feitas e eventos sociais, ou de uma celebridade. Poderia ser ainda o curriculum vitae de alguém extremamente empreendedor, que de tudo fez, e fez com excelência. Ao final de sua vida, todos imaginariam encontrar um homem realizado – alguém que alcançou um sentido para existir. Ao invés disso, o que o Sábio diz é que tudo não passou de enfado. Apenas canseira para o corpo e para a mente, sem sentido para o espírito.


Assim como autor de Eclesiastes, as pessoas do nosso tempo também têm se cansado da vida. Estão famintas, embora comam e bebam em abundância. Sentem-se incompletas, embora possuam muitas coisas. Eclesiastes mostra que não é possível encontrar o significado para esta vida porque ele está além da vida. Este livro está repleto de exemplos em que a experiência não proporciona completude à pessoa, antes, evidencia sua incompletude.


“Vaidade de vaidades – diz o sábio – tudo é vaidade”. O que o autor chama de vaidade é um sentimento irracional de desconexão entre causa e efeito, o qual resulta em indiferença. De tudo o homem experimenta, esperando encontrar um significado para a vida. Quando a capacidade de previr os resultados é contestada, o que sobra é uma indiferença para com as circunstâncias mundanas. Uma frustração que - ao extremo - resulta em completa apatia.


O autor de Eclesiastes verifica que é impossível ao conhecimento do homem descobrir um sentido para a existência. "Fiquei pensando: Eu me tornei famoso e ultrapassei em sabedoria todos os que governaram Jerusalém antes de mim; de fato adquiri muita sabedoria e conhecimento. Por isso me esforcei para compreender a sabedoria, bem como a loucura e a insensatez, mas aprendi que isso também é correr atrás do vento. Pois quanto maior a sabedoria, maior o sofrimento; e quanto maior o conhecimento, maior o desgosto.” (Ec 1:16-18).


“De que serve?”. Quando o significado da vida, que liga o ser humano ao mundo, se quebra, esse ponto de ruptura é a vaidade.  O Sábio, no ponto de ruptura com a validade da vida, passa a observar tudo a partir de um ponto distante. Ele se aliena do mundo e de si mesmo. A partir da distância, deste olhar imparcial, surge a possibilidade de rever a identidade do ser humano. Nesse ponto, em que nada mais faz sentido, a pessoa se encontra na disposição correta para dar o salto no vazio.  É esse o momento em que a pessoa se abre para o não-conhecível, para o impossível.


Assim como é impossível à mente humana conhecer o sentido para a vida – pois ele está além da capacidade do conhecimento humano – também é impossível conhecer a Deus. Não é possível conhecer a Deus, a não ser pelo que Ele mesmo revela de si e se deixa conhecer. Deus é pessoal. Ela busca se relacionar conosco. A experiência com Deus se dá na relação que firmarmos com Ele, e é na relação com Deus que a completude pessoal se materializa. De nada nos serve conhecermos a nós mesmos ou procurar conhecer a Deus – como objeto de estudo. É inútil querer saber tudo sobre Deus, analisá-lo, dissecá-lo, pois é a relação que nos dá significado.


Quando nos relacionamos com Ele, sua revelação de si mesmo nos completa, como essência além do conhecimento humano. Uma experiência pessoal com Deus vai além do possível. Se considerarmos que o possível é aquilo que podemos experimentar estando com os dois pés no chão, somente poderemos conhecer a Deus quando tirarmos os pés do chão: impossível.


Ao se jogar no impossível, o Sábio compreendeu que o significado da vida não está na vida, mas em Deus. Nele, tudo ganha sentido, até mesmo o enfado da vida. Nesta existência, vazia em si mesma, Deus deve ser o absoluto. "De tudo o que se tem ouvido, a suma é: Teme a Deus, e guarda os seus mandamentos: porque isto é o dever de todo homem. Porque Deus há de trazer o juízo todas as obras até as que estão escondidas, quer sejam boas, quer sejam más." (Ec  12:13,14)


Quando a vida não passa de futilidade – vaidade, nas palavras do sábio de Eclesiastes – o sentido está além do impossível, para além do vazio. A completude do coração, o significado à existência, o sentido para as relações interpessoais, o sabor da comida, o prazer das realizações, a razão para continuar existindo – todo o valor da vida somente pode ser encontrado em Deus. Para isso, precisamos deixar que Ele nos encontre.


E para que Deus nos encontre, só há um caminho, e este é Jesus: “Disse-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o Pai, o que nos basta. Disse-lhe Jesus: Estou há tanto tempo convosco, e não me tendes conhecido, Filipe? Quem me vê a mim vê o Pai; e como dizes tu: Mostra-nos o Pai?” (Jo 14:8,9)

Um salto no vazio ou A Matrix e o nascer de novo

Esse post é uma revisão do meu último, melhorado.
Tenho uma idéia recorrente que me encanta e assusta: a idéia de que não nos é possível viver com Deus sem um compromisso claro em abandonar a existência e se jogar em uma dúvida – mergulhar no vazio. Precisamos ser como um saltador de bungee jump, que confia sua vida a uma corda, sem, contudo, sentir a tensão da corda no momento do salto. Quando nos jogamos, o fazemos na certeza de que haverá algo que, não apenas nos salve da queda, mas que nos conceda uma experiência existencial mais valiosa, significativa, mais completa do que estando com os pés firmes no chão.
O salto no vazio retrata o desafio existencial relacionado a uma vida de fé. Quando se opta por uma postura de ateísmo materialista e racional, tem-se uma opção que possibilita uma certeza. A objetividade científica é capaz de proporcionar um solo firme onde se colocar. No entanto, não traz à alma conforto. A busca por um significado termina por nos deixar uma sensação de vazio e solidão. Vaidade de vaidades, tudo é vaidade. Por mais que seja possível explicar tudo através de uma abordagem racional, a arbitrariedade de uma morte iminente, inevitável e irremediável é uma angustia ao maravilhoso ser humano, capaz de acumular vastos conhecimentos através de gerações e gerações.
Quem cogita a conversão, vislumbra a possibilidade de encontrar conforto nos braços de um Deus-Pai. Mas este abraço só é experimentado após o salto. Largar das certezas e da solidez de uma lógica-razão-de-vida é abandonar a única coisa que se tem, para almejar um conforto existencial no não-lógico - loucura aos olhos do mundo. É o mergulho no nada, onde já não se é. Aceitar a Cristo significa anular o nosso próprio eu, os desejos, a carne, buscando um ideal de existência que está para além do eu. 
É possível comparar esse salto à experiência do personagem Neo, do filme Matrix – como, por sinal, o fez o Rev. Charlito em certa ocasião. O personagem Neo experimentava uma falta de propósito na vida, que o levou a descobrir a “Matrix”. “O que é a Matrix?” era a indagação que queimava em seu coração. No momento em que ele descobriria o que era a Matrix, Neo é confrontado com uma decisão sem volta: (a) tomar a pílula azul, esquecer de tudo e voltar à vida como era antes; ou (b) tomar a pílula vermelha e conhecer a Verdade, sem contudo poder experimentar essa verdade antes de tomar a decisão.  O filme mostra que a Verdade de Neo era uma realidade dura e sem volta. No entanto, sua existência ganhou propósito e razão, e, além de tudo, completude.
Tomar a pílula vermelha é um impulso para a morte. Apenas a angústia da falta de significado, por viver na razão "computer generated" da Matrix, é o que impele Neo a aceitar tal experiência, apesar de desconhecer o que estava para além daquela sala. Se ele soubesse o que havia no mundo real, teria ele tomado a pílula vermelha? Assim é a conversão: abandonamos o que temos de certo, anelando por um sentido maior.
A caminhada de cada um, enquanto nascido de novo, começa com um sentimento de incompletude. Um vazio interior que, aparentemente, nada é capaz de preencher. Surge uma pergunta, que brota de dentro pra fora. Cada pessoa enfrenta uma questão diferente, mas todas apontam para a mesma resposta. Nicodemos perguntou: “Como posso, depois de velho, nascer de novo?” Essa era a Matrix de Nicodemos.
E assim como Neo, precisamos tomar uma decisão que nos leva aonde não conhecemos. Essa é uma decisão que transformará a nossa maneira de enxergar o mundo; abrirá nossos olhos para realidades antes desconhecidas – ou ignoradas, ou desprezadas, ou mal entendidas. Tal como o fruto da árvore do conhecimento, depois de ingerido nos tira da ignorância suave e nos coloca no centro da ação.
Assim como com Neo, nem sempre é uma realidade mais tranqüila. Vemos-nos na difícil tarefa de enfrentar os nossos próprios egos, de negarmos a nós mesmo e carregarmos, cada um, a nossa cruz. Não é uma caminhada fácil. O caminho é árduo e a porta é estreita.
É também um caminho sem volta. Assim como é, no filme, libertar-se da Matrix. Em cena da trilogia, o personagem Cypher faz um acordo com os agentes da Matrix para ser reinserido no sistema: voltar à ignorância original. Logo em seguida, na estória, fica claro que não é possível retornar à Matrix. Da mesma forma acontece na vida cristã.
“Para onde irei, se só Tu tens palavras de vida eterna?”, diz Pedro a Jesus. Pedro tinha a perfeita compreensão de que, uma vez saído da caverna, não é mais possível acreditar em sombras. Eventualmente vemos irmãos que, depois de terem conhecido a Verdade, desejam retornar à vida de ignorância, como se fosse possível des-aprender – não mais saber o que se sabe verdadeiro. Assim como Cypher na Matrix, essa atitude apenas esfria o coração do verdadeiro propósito, sem, contudo, trazer paz.
A verdadeira paz está na realização do objetivo, da missão da existência. No entanto, diferentemente de Neo, nós não carregamos o destino em nossas próprias mãos. Não estamos sós. A despeito da dureza da realidade que se descortina à nossa frente, o nosso companheiro de percurso já fez o caminho até o final. E o concluiu com mérito. Jesus diz: “tende bom ânimo, pois Eu venci o mundo”. Ele venceu!  Ele já conhece o final do filme. E no final, ele vence. E estamos com ele. Logo, não devemos desanimar no meio da história.
Não acredito, contudo, que uma pessoa por si só seja capaz de tomar a decisão de se jogar no não-ser – para ser então capturado pelo Deus-pai-do-filho-pródigo de braços aberto. A natureza humana se agarra à certeza-miope, com medo. É preciso que Deus-Espírito-Santo arranque o homem de dentro da caverna. Somente a ação direta de Deus, abrindo os olhos do homem, o torna capaz de almejar enxergar algo que seus olhos não vêem. Deus é quem instiga em nós o desejo de ver o invisível. De experimentar o impossível. Não fosse Cristo e o seu Consolador, viveríamos em nossa auto-justificação – quando melhor. 
Quando o filho - estando em cima do muro - pula nos braços do pai, é apenas porque o próprio pai o ordena: pule! Somente após o primeiro salto é que o filho aprende que pode confiar no Pai, e pulará outras vezes. 
Oremos para que, nos momentos em que estivermos nos sentido muito firmes em nosso chão de racionalidade humana, nos lembremos de nos jogar nos braços do Pai, para nos encontrarmos com Ele além do salto, em meio ao não-ser, não-razão, não-certeza-humana. Que Ele nos motive a tomar um fôlego profundo e pular no nada. Tomar a pílula vermelha.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Salto para o Não-Ser

Domingo passado (25/01/2009) o Rev. Carlos Moreira utilizou o filme Matrix e o Mito da Caverna platônico como ilustração para a vida cristã.

Lembrei de uma música que escrevi.

A letra é a seguinte:

"Encontrei um bilhete, com minha própria caligrafia, que dizia:
fui ali me encontrar, não sei quando vou voltar.
E fiquei só.

Mergulharei no nada, onde já não sou e só tu és.
Mergulharei no nada, onde já não sou.

Não sei se você vai me segurar quando eu pular.
Não sei se você vai me segurar.
Vem me buscar."

Nessa música, procurei retratar o desafio existencial relacionado à uma vida de fé.

Quando se opta por uma postura de ateísmo materialista e racional, tem-se uma opção que possibilita uma certeza. A objetividade científica é capaz de proporcionar um solo firme onde se colocar. No entanto, não traz à alma conforto. A busca por um significado termina por nos deixar uma sensação de vazio e solidão. ("Fui ali me encontrar, e fiquei só"). Por mais que seja possível explicar tudo através de uma abordagem racional, a arbitrariedade de uma morte iminente, inevitável e iremediável é uma angustia ao maravilhoso ser humano, capaz de acumular vastos conhecimentos através de gerações e gerações.

"Mergulharei no nada..."
Quem cogita a conversão vislumbra a possibilidade de encontrar conforto nos braços de um Deus-Pai. Mas este abraço só é experimentado após o salto. Largar das certezas e da solidez de uma lógica-razão de vida é abandonar a única coisa que se tem para almejar um conforto existencial no não-lógico - loucura aos olhos do mundo. É o mergulho no nada, onde já não se é. Aceitar a Cristo significa anular o nosso próprio eu, os desejos, a carne, buscando um ideal de existência que está para além do eu. 

(Tomar a pílula azul é um impulso para a morte. Apenas a angústia da falta de significado do viver na razão "computer generated" da Matrix é que impele Neo a aceitar tal experiência, apesar de desconhecer o que estava para além daquela sala. Se ele soubesse o que havia no mundo real, teria ele tomado a pílula azul? Assim é a conversão: abndonamos o que temos de certo, anelando um sentido maior; uma vez tomada a pílula, não há mais como retornar à Matrix - "para onde irei, se só tu tens as palavras de vida eterna?")

"Vem me Buscar"
Por fim, não acredito que uma pessoa por si só seja capaz de tomar a decisão de se jogar no não-ser (para ser então capturado pelo Deus-pai-do-filho-pródigo de braços abertos). A natureza humana se agarra à certeza-miope com medo. É preciso que Deus-Espírito-Santo arranque o homem de dentro da caverna. Somente através da ação direta de Deus, abrindo os olhos do homem, o torna capaz de almejar enxergar algo que seus olhos não veem. Deus é quem instiga em nós o desejo de ver o invisível, não fosse Cristo e o seu Consolador, viveríamos em nossa auto-justificação, quando melhor. 

Quando o filho - estando em cima do muro - pula nos braços do pai, é apenas porque o próprio pai o ordena: pule! Apenas após o primeiro salto é que o filho aprende que pode confiar no Pai, e pulará outras vezes, até mesmo por própria iniciativa. 

Oremos para que, nos momentos em que estivermos nos sentido muito firmes em nosso chão de racionalidade humana, nos lembremos de nos jogar nos braços do Pai, se encontram além do salto, em meio ao não-ser, não-razão, não-certeza-humana.